O Acidente vascular cerebral é a segunda maior causa de morte no Brasil e a principal causa de incapacidade funcional em adultos. Dentre os tipos de AVC, o isquêmico é o mais frequente (cerca de 80%) dos casos e é causado pelo entupimento súbito de uma artéria cerebral, o que impede que o sangue chegue adequadamente a regiões importantes do cérebro, causando déficits neurológicos. O seu tratamento é uma emergência médica e até recentemente só podia ser feito com a administração de medicamentos (trombolíticos) pela veia. Entretanto, os trombolíticos só podem ser administrados nas primeiras 4,5 horas dos sintomas e tem um efeito parcial quando a obstrução é em uma das grandes artérias do cérebro, o que limitava o seu benefício.
Mais recentemente, uma outra modalidade de tratamento surgiu: o tratamento endovascular ou trombectomia mecânica. Através deste tipo de tratamento, um tipo de cateterismo, um microcateter é introduzido dentro dos vasos sanguíneos por uma artéria da virilha, e é avançado por dentro dos vasos até a artéria cerebral obstruída. Através deste cateterismo é possível utilizar dispositivos mecânicos para capturar ou aspirar o coágulo que está entupindo a artéria cerebral e assim desobstruir o vaso, restaurando o fluxo sanguíneo para o cérebro.
O benefício clínico deste procedimento já havia sido comprovado nos países do primeiro mundo e foi aprovado pela ANVISA para ser usado no Brasil, mas ainda não foi incorporado ao SUS pois ainda restavam dúvidas sobre a sua eficácia e custo-efetividade em países em desenvolvimento. Para resolver estas dúvidas foi realizado no Brasil o estudo clínico RESILIENT, que foi publicado esta semana na New England Journal of Medicine, principal revista científica médica no mundo. O estudo foi conduzido por pesquisadores brasileiros em 12 hospitais da Rede Nacional de Pesquisa em AVC, coordenado pelo Prof. Dr. Octávio Marques Pontes Neto, docente da FMRP-USP de Ribeirão Preto. Este estudo, que teve como pesquisadores principais a neurologista Sheila Martins (UFRGS – Porto Alegre) e o neurointervencionista Raul Nogueira (Emory University – Atlanta – EUA), contou com a participação importante das equipes da Neurologia Vascular e Radiologia Intervencionista do HCFMRP-USP, coordenadas pelo Profs. Octavio Pontese Daniel Giansante Abud. Em linhas gerais, o estudo RESILIENT demonstrou que a trombectomia mecânica aumenta em quase 3 vezes a chance do paciente com AVC isquêmico com oclusão de uma grande artéria do cérebro ficar independente e sem grandes sequelas, quando realizado dentro das primeiras 8 horas do início dos sintomas do AVC.
Segundo Prof. Dr. Daniel Abud, docente do Departamento de Imagens Médicas, Hematologia e Oncologia Clínica da FMRP, a equipe da Radiologia Intervencionista que ele coordena no HCFMRP-USP já tinha grande experiência como o procedimento, que vinha sendo custeado como recursos do próprio hospital nos últimos anos, com excelentes resultados. Segundo o pesquisador, a realização do estudo RESILIENT era importante para comprovar definitivamente sua eficácia e custo-efetividade no SUS. Já o Prof. Dr. Octávio Pontes, docente do Departamento de Neurociências e Ciências do Comportamento da FMRP-USP, destaca que esta publicação importante vem coroar o esforço e o trabalho realizado pelas equipes da Unidade de Emergência do HCFMRP-USP e dos outros Hospitais da Rede Nacional de Pesquisa em AVC, e vai acelerar a incorporação deste tratamento no SUS.
Segue o link para a publicação: https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa2000120…