Material produzido por alunos da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto é utilizado em unidades de saúde para informar idosos sobre a importância do sono
Num cenário em que o descanso tem sido cada vez mais negligenciado, especialmente entre a população idosa, uma cartilha simples, mas cuidadosamente elaborada, tem ajudado a resgatar a importância do sono para a saúde física e emocional. Produzido por alunos da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP, o material sobre higiene do sono vem sendo utilizado em unidades básicas de saúde como instrumento educativo e de cuidado contínuo com os pacientes.
A cartilha nasceu da escuta das próprias pessoas idosas, durante as visitas domiciliares realizadas pelos alunos como parte das atividades da disciplina Atenção à Saúde na Comunidade 2. Orientados pela professora Luciane Loures dos Santos, os estudantes identificaram a dificuldade para dormir como uma queixa comum entre os pacientes atendidos, associada a sintomas como sonolência diurna, irritabilidade, desânimo e até agravamento de condições clínicas.
“Uma das queixas mais comuns dos idosos era a dificuldade para dormir. Isso implicava em sonolência e mau humor, então pensamos, junto com os alunos, em produzir algo de orientação”, explica Luciane. A ideia resultou na criação de uma cartilha com linguagem acessível, visual atrativo e conteúdo técnico, transformado em orientações práticas para o cotidiano da população.
Educação em saúde que nasce da escuta
O processo de elaboração do material envolveu pesquisa em literatura científica, seleção de recomendações confiáveis e o desafio de converter o conteúdo técnico em uma linguagem compreensível. A cartilha traz orientações como manter uma rotina de sono, evitar cafeína no período noturno, reduzir estímulos luminosos e sonoros antes de dormir e criar um ambiente adequado para o descanso. Além disso, alerta para riscos da privação do sono, como piora da memória, aumento da compulsão alimentar, elevação da pressão arterial e impacto negativo sobre a saúde mental.
“Foi um desafio transformar um conteúdo técnico em algo que realmente pudesse ser compreendido e utilizado pela população”, relata Luiz Otávio Monteiro Chenci, aluno do 2º ano de medicina e integrante da equipe que elaborou o material. “Precisamos revisar bastante para garantir que tudo estivesse claro. Mas o maior aprendizado foi o processo de escuta da população. Muitas queixas são negligenciadas, e essa experiência nos ensinou a ouvir verdadeiramente.”
Durante os atendimentos, os estudantes perceberam que a dificuldade para dormir estava frequentemente relacionada a quadros de ansiedade, agitação e depressão. Para muitos pacientes, a entrega da cartilha representou mais do que informação — foi um gesto de acolhimento. “Quando levei a cartilha ao idoso que eu acompanhava, ele ficou muito feliz. Se sentiu escutado. Houve uma troca, e isso gerou gratidão”, conta Chenci. “Falar sobre sono é falar de saúde mental. Em um tempo em que o descanso é constantemente desprezado em nome da produtividade, precisamos insistir nessa conversa.”
Material que permanece na unidade e forma futuros profissionais
O uso da cartilha não se limitou às visitas dos alunos. O material foi incorporado à rotina da unidade de saúde e segue sendo distribuído por agentes comunitários e profissionais durante atividades com a população idosa. “Ela está na unidade. A gente distribui em outros momentos, então ainda mantém a questão da orientação permanente para os usuários, mesmo aqueles que não recebem visitas”, afirma a professora Luciane.
Para ela, a atividade uniu três pilares essenciais: formação acadêmica, vínculo com a comunidade e promoção de saúde. “A atividade foi importante porque os alunos aprenderam a identificar um problema comum, buscar na literatura científica e transformar isso numa comunicação acessível. É um processo completo de formação. Eles aprendem a pesquisar, a comunicar e a escutar.”
A experiência demonstra como uma ação simples, baseada na escuta, no conhecimento aplicado e na empatia, pode gerar benefícios concretos e duradouros tanto para a população quanto para os futuros médicos que aprendem, desde cedo, que a saúde começa pela atenção ao que o outro tem a dizer.
Eduardo Nazaré
Dr. Fisiologia — Assessoria de Comunicação da FMRP-USP