Onze médicos angolanos foram alocados em unidades de saúde de Ribeirão Preto e da região por meio do Programa de Formação de Recursos Humanos em Saúde firmado entre os governos do Brasil e de Angola
A Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP está entre as instituições brasileiras que recebem médicos angolanos em estágio de formação prática na área de atenção primária. Ao todo, 11 profissionais foram alocados em unidades de saúde do município e da região como parte de uma iniciativa que busca fortalecer a Medicina Geral e Familiar em Angola por meio da cooperação internacional.
“É uma parceria técnica, científica e também humanitária. Estamos recebendo profissionais que querem implantar um modelo semelhante ao nosso em seus territórios, onde a atenção primária ainda é centrada em hospitais e serviços especializados. O Brasil pode contribuir com sua experiência de organização comunitária e integração em rede”, afirma o professor Amaury Lelis Dal Fabro, que coordena a atividade em Ribeirão Preto.
A ação integra o Programa de Formação de Recursos Humanos em Saúde, firmado entre os governos do Brasil e de Angola em 2023, durante visita oficial da Presidência brasileira a Luanda. O acordo prevê a capacitação prática de médicos angolanos por meio de cooperação entre o Ministério da Saúde de Angola e universidades públicas brasileiras, como a USP.
Modelo brasileiro inspira novos caminhos
Segundo Dal Fabro, o estágio se baseia no contato direto com o cotidiano das equipes de saúde da família, unindo observação, discussões clínicas e participação em atividades teóricas com os residentes da Medicina de Família e Comunidade do Hospital das Clínicas da FMRP. “Eles acompanham tudo: consultas, ações de promoção da saúde, atividades comunitárias e aulas. Não podem atender diretamente por questões legais, mas vivenciam a rotina completa”, explica.
Os médicos angolanos foram distribuídos entre diferentes serviços de Ribeirão Preto: a Unidade Básica de Saúde da Vila Lobato, onde tem atendimento em pediatria, ginecologia e clínica médica; uma Unidade Distrital de referência no Distrito Oeste da cidade e ainda a unidade de saúde do município vizinho de Cássia dos Coqueiros.
Dal Fabro destaca que a FMRP já possui uma estrutura consolidada na atenção primária, com 21 equipes em campo e mais de duas décadas de experiência na formação de profissionais voltados para o cuidado comunitário. “Temos uma rede de unidades integrada ao ensino, envolvendo alunos da Medicina, Enfermagem, Odontologia, Farmácia, Fisioterapia, Psicologia e outras áreas da saúde. É uma formação interdisciplinar, com forte base territorial e social”, afirma.
Troca de experiências e impacto para ambos os países
A presença dos médicos africanos nas unidades também provoca um movimento de reflexão e aprendizado entre os profissionais brasileiros. “Sempre que recebemos residentes ou estagiários, somos estimulados a ensinar, revisar nossos métodos, repensar condutas. É um processo de formação mútua”, relatou o médico e diretor da UBS Vila Lobato, Luiz Roberto Verri de Barros.
Para os angolanos, a experiência é transformadora. “Estamos aqui para observar, entender e colher o que há de melhor. A atenção primária no Brasil é muito estruturada, e queremos adaptar essas boas práticas à realidade angolana”, afirmou o médico Antonio Jolomba Samatele. “Vamos levar esse conhecimento para salvar vidas no nosso país”, completou.
Dal Fabro ressalta que a iniciativa é um passo importante para estreitar os laços entre universidades e sistemas de saúde de países do Sul Global. “Angola passou por um longo período de guerra e está reconstruindo sua sociedade. A formação médica qualificada é fundamental nesse processo. E para nós, é uma chance de internacionalizar nossas ações, conhecer outras culturas e talvez criar caminhos futuros de cooperação em pesquisa e pós-graduação.”
Com apenas uma semana de estágio realizada até o momento, a experiência já tem se mostrado proveitosa, especialmente pelo contato direto com residentes, alunos e equipes das unidades de saúde. Segundo o professor Amaury Lelis Dal Fabro, a participação da FMRP vai além da formação técnica: “É uma contribuição técnico-científica muito importante. Uma das funções da universidade é estruturar modelos de atenção para que as pessoas usem, aperfeiçoem etc.”.
Por: Rose Talamone – Jornal da USP