Pesquisa realizada na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto mostra que dieta com poucas calorias e alto teor de proteína, embora preserve músculos, pode aumentar gordura na medula óssea e agravar a perda óssea
Uma dieta com alto teor de proteínas, amplamente adotada por quem busca emagrecer ou ganhar massa muscular, pode comprometer a saúde dos ossos se for combinada à restrição calórica. É o que revela o estudo Uma dieta hipocalórica e rica em proteínas tem impactos diversos nos tecidos adiposos muscular, ósseo e da medula óssea, conduzido na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP, publicado em 2025 na revista JBMR Plus e escolhido como o artigo do mês pela The International Adiposity Bone Marrow Adiposity Society.
O trabalho foi desenvolvido no mestrado da aluna Beatriz Coimbra Romano e orientado pelo professor Francisco José Albuquerque de Paula, do Departamento de Clínica Médica da FMRP. Os pesquisadores acompanharam as dietas de um grupo de ratas que seguiram diferentes padrões alimentares ao longo de oito semanas. Os resultados indicam que, embora a dieta rica em proteínas ajude a preservar os músculos, ela agrava a perda óssea e aumenta a gordura na medula óssea, um fator associado ao risco de osteoporose.
Dietas da moda podem ter efeitos ocultos ao organismo
A pesquisa foi motivada por um padrão alimentar cada vez mais popular: a combinação de poucas calorias com aumento de proteínas, adotada por pessoas que buscam emagrecer sem perder massa muscular. “A restrição calórica tem sido utilizada como hábito saudável e existe evidência de que pode aumentar a expectativa de vida, mas também é comum entre pessoas que querem emagrecer por conta própria, sem acompanhamento profissional”, explica Beatriz.
O estudo buscou justamente entender o impacto dessa estratégia sobre o organismo como um todo. Para isso, foram utilizados três grupos de ratas: um grupo controle com alimentação normal, um com 30% a menos de calorias, e outro com 30% a menos de calorias e 40% a mais de proteína.
A principal descoberta foi a preservação da massa muscular no grupo que recebeu a dieta hiperproteica. No entanto, essa mesma dieta acentuou a redução da massa óssea e aumento expressivo de gordura dentro da medula óssea.
“Essa contradição mostra que nem sempre uma estratégia que funciona para uma parte do corpo funciona para todas”, comenta Beatriz. “A proteína ajuda o músculo, mas pode prejudicar os ossos em dietas restritivas.”
Por que a gordura da medula é um problema?
Segundo o professor, o aumento da gordura na medula óssea, também chamada de MAT (do inglês marrow adipose tissue), já é conhecido como um fator de risco para baixa densidade mineral óssea. “Diversos trabalhos mostram que há relação negativa entre gordura na medula e saúde óssea. O nosso estudo reafirma esta colocação. Os animais que apresentaram maior expansão de tecido adiposo da medula óssea mostraram menor massa óssea”, afirma o pesquisador.
O grupo identificou ainda que as células-tronco hematopoiéticas da medula apresentam maior potencial para se diferenciar em osteoclastos — células responsáveis pela reabsorção óssea. Isso significa que o processo natural de degradação do osso pode ser mais acelerado.
Mais proteína nem sempre é a solução
O estudo acende um alerta importante para quem segue dietas da moda ou muda a alimentação por conta própria. “Mudanças alimentares sem orientação podem ter efeitos negativos silenciosos, como os vistos em nossa pesquisa”, alerta Beatriz.
Apesar dos resultados promissores na preservação da massa magra, os autores recomendam cautela e acompanhamento profissional ao adotar esse tipo de dieta. “É preciso considerar não apenas o benefício muscular ou a perda de gordura, mas os efeitos no organismo como um todo”, destaca o professor.
Alerta para mulheres jovens e adolescentes
A pesquisa foi realizada somente com fêmeas, por uma razão clínica: a anorexia nervosa, condição de restrição alimentar crônica, afeta principalmente mulheres jovens — fase decisiva para a formação da “poupança óssea” que será usada ao longo da vida.
“Nossos dados sugerem que a estratégia de aumentar proteínas na dieta durante a restrição calórica pode ser prejudicial à massa óssea, o que é especialmente preocupante nessa fase da vida”, reforça o professor. No entanto, é preciso considerar que este é um estudo experimental e que não pode ser extrapolado diretamente para a clínica.
A equipe continua investigando os efeitos de diferentes padrões alimentares sobre a saúde óssea. Estudos com proteína vegetal, dieta cetogênica e outros modelos estão em andamento. “Nosso objetivo é ampliar o entendimento sobre o impacto da nutrição na integridade do esqueleto”, conclui Albuquerque de Paula.
Texto: Eduardo Nazaré – Dr. Fisiologia