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Concentrações reduzidas de cobalto no sangue podem estar associados à obesidade feminina

Estudo identifica diferenças nas concentrações de cobalto no sangue de mulheres com obesidade e sugere que o mineral pode influenciar a regulação genética e o metabolismo, impactando o ganho de peso e doenças associadas

O cobalto é um componente da vitamina B12 (cobalamina) e pode ser encontrado em alguns alimentos como vegetais, chocolate e carnes. Existe também um uso não tão saudável deste mineral, porque o cobalto é um metal essencial para as tecnologias atuais, sendo amplamente utilizado em baterias de lítio. O que até então não se sabia, e está sendo revelado por pesquisas recentes, é sua possível relação com a obesidade em mulheres. 

O estudo multicêntrico: “Concentração sérica de cobalto e assinaturas de metilação de DNA em mulheres com obesidade” publicado na revista científica Obesities, observou diferenças significativas nos níveis sanguíneos de cobalto em mulheres com obesidade em comparação àquelas com peso normal. Além disso, foram identificadas alterações genéticas associadas ao metal, sugerindo que o cobalto pode influenciar processos biológicos relacionados ao metabolismo e ao desenvolvimento de doenças cardiovasculares e  diabetes tipo 2. Os resultados destacam ainda a importância de considerar fatores ambientais e nutricionais na prevenção e tratamento da obesidade.

Os pesquisadores da USP, da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (Famerp) e da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, em Portugal, analisaram dados de 33 mulheres brasileiras, 17 com peso normal e 16 com obesidade. Os resultados indicaram que os níveis de cobalto no sangue das participantes com obesidade eram significativamente menores que as de peso normal. Segundo os pesquisadores, essa deficiência pode estar relacionada à dieta pobre em nutrientes  e às alterações metabólicas associadas à obesidade.

O grupo também observou a relação do cobalto com a metilação do DNA, epigenética, um tipo específico de alteração no material genético humano que não modifica a sequência do DNA, que pode ter influência sobre a regulação de um gene, ativando ou desativando a sua atividade e afetando as funções metabólicas. As análises revelaram diferenças nos padrões de metilação do DNA entre os grupos estudados, indicando que o cobalto pode desempenhar um papel na regulação epigenética relacionada à progressão da obesidade.

A regulação epigenética é responsável no início da vida, pela diferenciação de células, possibilitando a formação de vários tecidos. Na vida adulta a epigenética tem muita relação com o estilo de vida, como nutrição, atividade física e qualidade do sono, que é capaz de modificar os padrões de metilação, seja pelo aumento quanto pela diminuição de metilação do DNA. Esses mecanismos podem estar relacionados à manutenção de saúde e ao desenvolvimento de doenças como, por exemplo, o câncer, explica a professora Dra. Carla Barbosa Nonino, do Departamento de Ciências da Saúde da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP, pesquisadora responsável pela pesquisa. 

Impacto do cobalto no organismo

Segundo Natália Yumi Noronha, doutoranda no Departamento de Clínica Médica da FMRP e orientanda da professora Carla, o cobalto é um mineral essencial para a produção de células do sangue, o funcionamento do sistema nervoso: “O cobalto pode influenciar processos metabólicos, uma vez que uma alimentação pobre em alimentos de origem animal, como carne, leite e ovos, pode acarretar redução do metal no organismo, afetando o metabolismo e possivelmente contribuindo para o ganho de peso e outros problemas de saúde”, afirma.

Ainda, segundo Natália, a obesidade está associada a deficiências nutricionais e argumenta que, mesmo com um consumo calórico alto, a qualidade da alimentação pode ser inadequada, com baixa ingestão de vitaminas e minerais essenciais. Por isso, diz a pesquisadora, “os achados do estudo reforçam a importância de investigar não apenas a quantidade de alimentos consumidos pelos pacientes com obesidade, mas também a qualidade, para entender melhor os impactos da dieta na obesidade e na saúde em geral”.

Epigenética, metabolismo e padrões de metilação modificáveis

Para a professora Carla, o cobalto pode ser considerado essencial ao organismo, quando em quantidades adequadas, se torna um contaminante, quando em excesso. Assim, as causas da deficiência de cobalto na obesidade feminina precisam ser melhor investigadas com acompanhamento nutricional e clínico. 

A epigenética, estuda como o ambiente e o estilo de vida podem alterar o funcionamento de nossos genes, sendo assim a professora acredita que essa seja  mais uma ferramenta para auxiliar no entendimento das vias metabólicas associadas à obesidade. Para a professora, essa ferramenta pode permitir a identificação de padrões alimentares que seriam interessantes para ativar ou inativar genes específicos por meio de padrões de metilação modificáveis.

A partir desses resultados, diz a professora Carla, sua equipe deve investir em estudos com foco na miscigenação da população brasileira. “São escassas as pesquisas sobre metilação do DNA em populações miscigenadas. Além disso, as novas pesquisas também incluirão mais indivíduos e com diferentes condições de saúde, não só a obesidade.” 

Atualmente o grupo trabalha em análises de bioinformática para identificação da ancestralidade a fim de descobrir as origens geográficas e características específicas, “demonstrando como o ambiente pode impactar no desenvolvimento do indivíduo e, potencialmente, o de gerações futuras”, afirma.

O estudo, que teve a colaboração do grupo do Professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto-USP, Fernando Barbosa Jr, foi financiado pela agência de fomento FAPESP. O estudo contou com o auxílio de pesquisa “Do biomonitoramento ao reconhecimento de assinaturas do exposoma humano visando antecipar riscos para uma saúde contínua”. 

A pesquisa teve ainda a participação dos pesquisadores: Luísa Maria Diani, bolsista da FAPESP que compartilha a primeira autoria do projeto, Guilherme da Silva Rodrigues, Isabela Harumi Yonehara, Vanessa Aparecida Batista Pereira, Marcela Augusta de Souza Pinhel, Lígia Moriguchi Watanabe e  Déborah Araújo Morais.

Mais informações: carla@fmrp.usp.br.


Texto: Arthur Santos, estagiário da FMRP-USP