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Proteases virais ativam o inflamassoma CARD8 em o sistema cardiovascular humano

Autores: Hellen Anastácia Soares e Luiz Felipe Araujo
Editado por Vânia Bonato
Referência: NADKARNI, Rhea et al. Viral proteases activate the CARD8 inflammasome in the human cardiovascular system. Journal of Experimental Medicine, v. 219, n. 10, p. e20212117, 2022.

Texto elaborado por estudantes do Programa de Pós-Graduação em Imunologia Básica e Aplicada (PPG-IBA – FMRP-USP). O texto representa um dos requisitos para a avaliação dos estudantes de doutorado cursando a disciplina Journal Club

O vírus cardiotrópico coxsackie B (CVB3) é responsável pela maioria dos casos de miocardite aguda e cardiomiopatia inflamatória. Sendo citolítico, CVB3 induz a secreção de IL-1β e de padrões moleculares associados ao dano (DAMP). Os receptores similares ao domínio de oligomerização ligante de nucleotídeo (NLRP) são receptores de reconhecimento de padrões intracelulares que reconhecem tanto sinais de DAMP quanto padrões moleculares associados a patógenos (PAMP). Os NLRP estão expressos em diferentes tipos celulares, como nas células endoteliais (EC). Nadkarni et al. (2022) buscaram identificar a função do NLRP e de CARD8 em células endoteliais no contexto de infecção por CVB3.

Inicialmente, os autores usaram EC primárias de aorta humana (AEC) de indivíduos saudáveis e descreveram que NLRP1 e CARD8 eram os sensores predominantes. A seguir, mostraram que o tratamento com ValboroPro (VbP), um ativador para ambos os sensores, NLRP1 e CARD8, resultou na clivagem da caspase 1 e da gasdermina (GSDMD) em AEC. O VbP também induziu a secreção de IL-18. A morte celular induzida pelo tratamento com VbP foi parcialmente bloqueada em células CARD8-knockout (KO) e NLRP1-KO e foi completamente anulada em células duplo KO para CARD8 e NLRP1. Essas observações sugerem que CARD8 e NLRP1 podem formar inflamassomas funcionais em AEC e ambos podem ser ativados simultaneamente por VbP.

Em seguida, os autores questionaram se o CVB3 poderia ativar o inflamassoma NLRP1 ou CARD8 em AEC e em cardiomiócitos (CM) por meio de suas proteases 2A e 3C. Para responder tal questionamento, AEC foram infectadas com CVB3, sendo constatada morte por piroptose induzida pelos vírus em decorrência da clivagem de GSDMD. No entanto, ao contrário do tratamento com VbP, a morte celular induzida por CVB3 dependeu apenas de CARD8, enquanto AEC NLRP1-KO foram mortas tão eficientemente quanto as células do grupo controle após a infecção por CVB3. Para avaliar o inflamassoma CARD8 em CM, os autores geraram CM derivados de células-tronco pluripotentes humanas (hPSC) e mostraram que CM infectados com CVB3 também sofreram piroptose mediada por CARD8, semelhante às observações encontradas em AEC. Além disso, a ativação de CARD8 induzida por infecção por CVB3 foi dependente da degradação da porção N terminal de CARD8 pelas proteases 2Apro e 3Cpro do CVB3. A superexpressão transitória de CVB3 2Apro ou 3Cpro em células HEK293T que expressam CARD8 também levou à degradação de CARD8-NT e ao aparecimento de produtos de clivagem N-terminal, sugerindo que 2Apro ou 3Cpro sozinhos são suficientes para ativar o inflamassoma CARD8. Os autores também
descreveram que o inibidor de 2Apro, SNAP, e o inibidor de 3Cpro, Rupintrivir, reverteram a clivagem mediada por CARD8 e preveniram a piroptose das AEC infectadas.

Por fim, Nadkarni et al. (2022) examinaram o papel do inflamassoma CARD8 na replicação e disseminação de CVB3. Realizaram experimentos de co-cultura, nos quais AEC e CM foram separados por uma membrana transwell de 0,4 μM, suficiente para a passagem do vírus. Com as AEC infectadas com CVB3 e mantidas no lado apical, os autores puderam examinar a disseminação viral para os CM subjacentes. Curiosamente, os CM subjacentes foram protegidos da infecção apical por CVB3 quando os AEC doadores eram deficientes em CARD8, como evidenciado pelo número reduzido de cópias do genoma de CVB3 e pela expressão de proteínas virais nos CM co-cultivados com AEC CARD8-KO, sugerindo que CARD8 potencializa a replicação e propagação de CVB3.

Com o conceito de que a miocardite é caracterizada pelo recrutamento de leucócitos para o miocárdio, os autores perguntaram se CARD8 afetava a adesão leucocitária induzida por CVB3 e descobriram que CARD8-KO reduziu significativamente a expressão de ICAM-1 em AEC, um ligante para LFA-1, que estabiliza as interações dos leucócitos com o endotélio. Como esperado, os AEC CARD8-KO recrutaram menos leucócitos após a infecção por CVB3. Além disso, os CM CARD8-KO reduziram a expressão de genes próinflamatórios e responsivos ao interferon, indicando
que CARD8 contribui diretamente para a inflamação cardíaca induzida por CVB3. No geral, esses resultados mostram que o vírus coxsackie B3 ativa o inflamassoma CARD8 em células endoteliais aórticas humanas e em cardiomiócitos, induzindo inflamação, modulando a infecção viral e, consequentemente, a patogênese mediada pelo CVB3.