Um estudo acerca dos mecanismos celulares e moleculares envolvidos na geração da expiração ativa pela Região parafacial Lateral recebeu o prêmio Early Investigator Prize 2021 (clique aqui) de melhor trabalho na categoria Fisiologia Respiratória pelo The Journal of Physiology. O artigo integra o doutorado de Karolyne Silva Magalhães, financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (clique aqui) no Programa de Pós-Graduação em Fisiologia, sob orientação do professor Davi José de Almeida Moraes, ambos da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP.
“A oportunidade de publicar esse estudo em um periódico com tanto prestígio na área da Fisiologia e Neurociências, como o The Journal of Physiology, já foi um grande reconhecimento para mim. Nós, pesquisadores, trabalhamos arduamente para desenvolver estudos como esse. Eu já estava muito grata pelo reconhecimento que havíamos recebido até então com esse estudo. Por exemplo, uma figura do nosso trabalho foi escolhida para compor a capa da edição em que publicamos, além disso, esse trabalho foi comentado duas vezes em edições seguintes do periódico por pesquisadores importantes da nossa área”, conta Karolyne.
Assim, a educadora física ainda revela que a sensação de receber o prêmio foi inenarrável. “Eu sou muito grata pela oportunidade de trabalhar com o Professor Davi Moraes nos últimos 5 anos e pela colaboração essencial que recebi de pesquisadores da nossa instituição e de outras instituições nacionais e internacionais neste trabalho e ao longo da minha formação científica e acadêmica. Sem esse suporte, é provável que essa premiação não fosse uma realidade para mim hoje”, afirma.
Sobre o estudo
De acordo com a pesquisadora, a compreensão da comunidade científica sobre como o sistema nervoso central gera os movimentos respiratórios é relativamente recente quando comparada a outras áreas de estudo da Fisiologia. “Hoje sabemos que a inspiração em mamíferos em condições fisiológicas é determinada pela atividade de neurônios inspiratórios com características de marcapasso na superfície ventral do bulbo, especialmente em uma região denominada de Complexo pré-Bötzinger”, explica.
Por outro lado, existem algumas condições em que os músculos expiratórios podem ser recrutados, como durante condições de aumento de CO2 (hipercapnia/acidose), diminuição de O2 (hipóxia) ou durante a realização de exercício físico. Esse recrutamento é chamado de expiração ativa, sendo um importante mecanismo compensatório para aumentar a ventilação pulmonar durante estas condições de desafio respiratório/metabólico.
“Somente no início dos anos 2000, foi descoberta uma região, também localizada na superfície ventral do bulbo, que contém neurônios expiratórios, os quais determinam a geração da expiração ativa. Atualmente, essa região é conhecida como Região parafacial Lateral. Desde a sua descoberta, uma série de estudos importantes acerca dessa região foram desenvolvidos. Entretanto, as características eletrofisiológicas e moleculares, as conexões com outras regiões do sistema nervoso central, bem como os mecanismos celulares envolvidos na geração da expiração ativa pelos neurônios da Região parafacial Lateral ainda não eram conhecidas”, explica.
Sendo assim, o estudo (clique aqui) descreveu pela primeira vez que os neurônios expiratórios da Região parafacial Lateral são excitatórios, ativam os neurônios que inervam os músculos expiratórios da região abdominal e que, diferente dos neurônios vizinhos a essa região, não são diretamente estimulados pela hipercapnia/acidose para gerar a expiração ativa.
“Demonstramos também que a ausência da expiração ativa em condições fisiológicas é devido a inibição dos neurônios expiratórios da Região parafacial Lateral pelos neurônios respiratórios do tronco cerebral, incluindo os neurônios inspiratórios do Complexo pré-Bötzinger. Além disso, identificamos a expressão de diferentes canais iônicos e propriedades eletrofisiológicas intrínsecas nesses neurônios que são responsáveis por modular a sua atividade durante condições que recrutam a expiração ativa”, conta.
Outra descoberta do estudo é em relação a atividade expiratória desses neurônios e a geração da expiração ativa durante condições de hipercapnia/acidose. “Ela ocorre em função da remoção da inibição, e não por meio da ativação gerada por outros neurônios do sistema nervoso central, bem como que os neurônios expiratórios da Região parafacial Lateral não possuem propriedades de marcapasso, diferente dos neurônios inspiratórios do Complexo pré-Bötzinger. Logo, a geração da expiração ativa não é uma atividade gerada intrinsicamente e sim por meio de conexões com outros neurônios respiratórios, incluindo os neurônios inspiratórios”, explica.
Segundo Karolyne, os resultados são importantes para a comunidade científica por ampliar o conhecimento sobre os mecanismos celulares e moleculares envolvidos na geração da expiração ativa pela Região parafacial Lateral.
“Principalmente porque refutamos a hipótese de que a geração da expiração ativa dependeria de atividade de marcapasso (com oscilações intrínsecas) de neurônios no tronco cerebral. A expiração torna-se ativa durante o exercício físico vigoroso quando a demanda metabólica é aumentada, em altitudes onde os níveis de O2 são reduzidos (hipóxia) e intermitentemente no sono de movimento rápido dos olhos, para contrabalancear as irregularidades respiratórias. Além disso, a expiração ativa é um componente vital de vários comportamentos motores e emocionais, como falar, rir, chorar ou mesmo tocar instrumentos musicais. Por fim, o recrutamento da expiração ativa facilita a ventilação pulmonar, neutralizando o aumento da resistência das vias aéreas e a dessaturação de O2 em crianças com suspeita de distúrbios respiratórios do sono”, conclui.
Mais informações: ksmagalhaes@usp.br ou davimoraes@fmrp.usp.br